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domingo, 24 de agosto de 2014

NELSON MACHADO GUIMARÃES E O PROCESSO DA ALA VERMELHA

        NELSON MACHADO GUIMARÃES E O PROCESSO DA                 ALA VERMELHA

Foi ele. O juiz que conduziu o processo da Ala Vermelha, em 1972.

No primeiro dia do julgamento por um acordo com o comandante do DOI CODI Brilhante Ustra, o juiz Guimarães trocou a condição de réu de meu pai, Edgard de Almeida Martins, pela de testemunha-informante retirando-o do processo e trocando esse depoimento de quinze minutos recolhido pelo delegado-torturador Edsel Magnotti, em 29.10.1971 no prédio do DEOPS supervisionado por torturadores do DOI, que o escoltavam. Substituiu-o por outro montado pelos próprios agentes do CODI produzido depois de 90 dias de interrogatórios e de longa detalhada investigação.
Esse falso depoimento foi lido pelo juiz, usado como espinnha dorsal que orientou o processo da Ala Vermelha.

Por ordem direta de Ustra o carcereiro "Roberto" fez a troca do depoimento onde o juiz se baseou para definir as penas dos militantes da Ala, que mesmo presentes naquele tribunal de exceção, alguns ainda eram considerados foragidos da Justiça obrigando meu pai a reconhecê-los. Cena que deu margem a interpretações errôneas, mas todos os presentes o assinaram garantindo a continuidade do processo distante dos verdugos comandados pelo major Ustra.

O juiz Magalhães pedia que grupos de sete presos se levantassem por vez e que meu pai apontasse um confirmando o nome do apontado. Isso ocorreu com Diniz Cabral Filho, Élio Cabral Sousa e mais um camarada de MG. Élio Cabral de Souza (“Mateus” “Campos”) ergueu o braço e disse presente, se identificando dessa forma. O comportamento de meu pai foi acertado antes com o advogado de defesa Dr. Hélio Navarro, que também se encontrava preso e com o senador do Lindoso do AM, que tinha sido eleito pela ARENA, logo depois do sequestro de seu filho Felipe José Lindoso, dirigente regional da AV.

Meu pai passou informalmente de prisioneiro do DOI CODI a prisioneiro do Alto Comando do II Exército pela interferência do coronel Gualter Ferreira dos Santos, que tinha sido comandante do Batalhão de Fronteira, em Cáceres/MT onde moramos em 1968. O coronel intercedeu por meu pai, depois de comunicado pelo sargento Luís Gonzaga Marques ("Agostinho"), que era do PCB e estava migrando para o PC do B formando uma base de apoio na colônia Rio Branco, hoje Mirassol, cidade do MT. O sargento Marques, atuava política e clandestinamente na região ao mesmo tempo, que trabalhava naquele batalhão do exército e conhecia seus meandros internos.

A intervenção dos dois militares e de um cunhado - meu tio Francisco Teizen, que era PM em Bastos no interior de SP, mais a participação da família em sua busca quando ainda era mantido incomunicável (na tortura). Chegamos a pedir exílio em duas embaixadas: na do México e da Bélgica, foram decisivas na sobrevivência de meu pai. Principalmente, a do coronel Gualter, que trabalhava diretamente subordinado ao comando do II Exército de São Paulo. O comando do DOI CODI só acatava ordens de outro comando militar superior e somente a partir dessas interferências cessaram as torturas e suplícios que meu pai sofria, em suas dependências.

Gonzaga Marques deu ao seu filho o nome de Chuenlai, hoje jornalista atuando no estado do MT.

                               "LIBERDADE VIGIADA”

Mesmo liberado pela Justiça Militar, meu pai um civil da classe trabalhadora sem acusação alguma permaneceu "sob a tutela do DOI CODI", como consta em documento assinado pelo Ustra.

Foi perseguido até 1980 pelos agentes da repressão inclusive voltando a sofrer constantes ameaças de torturas e desaparecimento. Quando anunciavam a morte de algum combatente de esquerda, sempre diziam que ele seria o próximo... Os militantes da Ala Vermelha permaneceram presos e distribuídos em presídios diferentes, com advogados que recorreram conseguindo reduzir as penas ditadas pelo tal juiz. Ninguém mais da Ala Vermelha voltou ao DOI/CODI. O processo chegou ao STF.

Na auditoria do STM, em SP esse julgamento durou três dias sendo os dois últimos secretos. A partir desse dia, o chefe análise e interrogatório do DOI CODI e informante direto do juiz Machado Guimarães, o capitão André Leite Pereira Filho passou a usar o codinome "Dr. Edgar" e segundo Marival Chaves (ex-funcionário do DOI-CODI, que abandonou o cargo em 1972) foi ele quem comandou o interrogatório, que levou a morte o jornalista Vlado Herzog, em 1974.

Meu pai encerrou seu tempo de clandestinidade tirando documentos legais no fim daquele mesmo ano em que foi capturado (1971) voltando a exercer sua profissão de mecânico eletricista, porém sem o direito de trabalhar em fábricas, o que aconteceu até 1978, sempre cerceado e perseguido pela repressão política da ditadura. Por esse motivo sem nenhuma atividade partidária.

E depois ainda teve que se defender da desconfiança e ataques de burocratas da história da esquerda, por conta desse episódio nefasto, que foi tratado de modo maniqueísta, sem o devido apuro das informações, sem o contraditório. Apenas sustentada e reproduzindo essa farsa gerada pela contrainformação do DOI CODI, avalizada pelo juiz que tornava aquele tribunal militar, em apenas uma extensão das salas de torturas do DEOPS e das instalações da Rua Tutóia.

                                      THAELMAN CARLOS – 25.08.2014/SP 


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